O mundo é assim

* Anne Minuzzo

Professora, estudante de Letras

 

Por sugestão de matéria publicada no Correio do Povo, 152 crianças da Escola Amélia Schemes, localizada no bairro Águas Claras, em Gravataí, estavam em grande expectativa. No dia 05 de dezembro, uma visita a Casa de Cultura Mário Quintana se pronunciava como uma grande e inédita aventura. Além de visitar a morada do poeta, eles iriam ao teatro, ao teatro de verdade! Para aquela comunidade, em grande parte (e em vários aspectos) carente, um passeio pode ser uma grande descoberta. E para quem acompanha, é como redescobrir o gosto novo de coisas antigas.

            Na chegada, o grande prédio cor-de-rosa parece gigante. Onde será que o poeta dormia? E de repente, lá está ele, em uma sacada, como um anjo pairando, a observar, benevolente. Outra surpresa mágica e divertida: entra uma senhora carregando Mário Quintana nos braços! Seria tão leve o poeta? Ah, é mais um boneco, mas de longe, tão real, como se estivesse adormecido.

            Subimos os vários lances de escadas e entramos no teatro. Procuramos o melhor lugar naquela semi-escuridão já misteriosa. No palco, um cenário aguarda os atores. O espetáculo vai começar – Prô, o teatro é de gente ou de bonecos? O teatro é de gente, turma! De gente que são os atores Christian Lavich Goldschmidt, Raquel Peruzzo e Andrea Ayres, que fazem crianças muito do jeitinho que elas são – acima de tudo, sempre curiosas para aprender.

            E então, através da magia do teatro, que é gradual e irreversível, se descobre que, no Rincão Gaia, refúgio da cidade sem cores, é possível se sonhar e viver um mundo melhor, onde todos fazem parte de um ideal que ainda une as pessoas – a natureza. Com bonecos, cobras, sapos, lacraias e músicas divertidas, os atores mostram que qualquer ser vivo tem sua função no mundo natural, cada um com sua importância. O mundo é assim: a misteriosa engrenagem que funciona, misteriosamente, tão harmoniosa.

            E a aprendizagem mais importante ainda se dá com responsabilidade: os atores, ao final, pedem às crianças que aceitem um desafio, ou melhor, uma missão de verdade: passar adiante o que descobriram – que todos fazem parte da natureza. Ela faz parte de nós. E assim saimos pensando do teatro Bruno Kiefer. Ao darmos adeus ao poeta na sacada, percebemos que nos olhava como que nos dizendo pra gente voltar. A conclusão é a de que, aquilo que aprendemos de forma lúdica fica para sempre.

 

Artigo publicado no Jornal Correio do Povo, na sexta-feira, 29 de dezembro de 2006 / porto Alegre - RS

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