Sobrará Tempo

 Há os que dizem que a Conferência das Nações Unidas no Rio de Janeiro, em junho deste ano, foi um fracasso. É verdade que não foram assinados convênios, tratados ou acordos realmente significativos e com força de lei internacional. O que foi assinado é fraco em conteúdo e em força de execução. Mas, foi desencadeando um processo de conscientização a nível mundial, cujas conseqüências são ainda imprevisíveis, porém irreversíveis. Em seu tempo, a Conferência de Helsinki, aparentemente, também nada ou pouco realizou, mas, em retrospectiva, podemos ver que desencadeou o colapso dos regimes repressivos do Leste.

 

A insistência no conceito de “desenvolvimento sustentável”, mesmo repetido apenas como slogan, ou como simples mantra por alguns, demostra que começa entre os poderosos a surgir a percepção de que a atual situação da Humanidade é insustentável.

 

Uns vinte por cento das populações humanas, no chamado Primeiro Mundo, incluindo os abastados no resto, vivem um estilo de vida de consumismo despreocupado que leva a esbanjamento desenfreado de recursos irrecuperáveis e à demolição progressiva de todos os sistemas de suporte de vida no Planeta. A médio prazo, ou seja,  durante a vida das crianças de hoje, este modo de vida levará a terríveis calamidades, muitas das quais já se vislumbram. No entanto, a doutrina econômica predominante, o desenvolvimentismo, prevê sua extensão até o mais remoto rincão.

 

A realizar-se esta pretensão, o desastre se adiantaria acelerado e, enquanto durar a situação atual, os outros oitenta por cento cairão cada dia mais fundo na miséria, o grande processo vital na Terra, único planeta vivo que conhecemos, estará terrivelmente avariado.

 

Está desencadeado o repensar de nossos dogmas. Supostamente “progresso” e “desenvolvimento” significariam mais felicidade para maior número, em um mundo mais sustentável, mais harmônico. O contrário está acontecendo. Em números absolutos, nunca houve tanta miséria, tanta insatisfação, nunca tanta devastação.

A glasnot e a perestróica de nossa cultura industrial global apenas começam...  

José A. Lutzenberger
Dezembro 1992



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