Pessoalmente, desde minha infância e juventude, sempre tive um relacionamento espiritual com a natureza. Por isso, lavouras de arroz que conheci, sempre me fascinaram.
Naquela época a orgia dos agrotóxicos não era sequer imaginável. As lavouras ainda eram bem menores,
taipas eram feitas à pá por peões e a colheita era manual, à foice, por grupos de trabalhadores migrantes.
As trilhadeiras eram estacionárias. Muita água era puxada à locomóvel - máquinas à vapor que queimavam
lenha. Ainda na segunda metade dos anos quarenta, como estudante de agronomia, trabalhava em lavouras de arroz,
como agrimensor, à serviço do Banco do Brasil. Conheci e me extasiava a fantástica fauna avícola palustre -
desde a jaçanã, maçarico (ibis), marrecos, mergulhões, até as garças, colheireiros, joão grande, tajã e
outros, mais os répteis, anfíbios e peixes, assim como insetos como a simpática libélula e infinidade de
outros seres fascinantes, incluindo toda uma flora de grande diversidade e beleza. Foi por isso, por desespero, que iniciei a luta ambiental que até hoje me prende, estou com 73 anos. Tenho hoje a grande satisfação , uma das maiores de minha vida, de ver esta fauna quase totalmente recuperada. Os venenos no arroz estão limitados a alguns herbicidas que, espero, desaparecerão em breve. A lavoura de arroz é um banhado artificial. Juntamente com os açudes que ela requer, constitui um importante enriquecimento da paisagem do Pampa. Problemas começam a surgir com os métodos agressivos da agricultura moderna, especialmente com os agrotóxicos, mas temos lindos exemplos de como evitá-los com os métodos de agricultura regenerativa, entre eles o plantio pré-germinado, o uso de herbicidas até diminuindo. Muito graves também têm sido e continuam sendo os problemas ecológicos resultantes da dragagem destrutiva de banhados naturais.Graves também são os problemas que têm sua origem em fatores sociais e políticos. Em sua maioria, as lavouras de arroz são feitas por arrendatários. Estes, sem esperança econômica e sem garantia de poder voltar a plantar no mesmo lugar, não vêem interesse em trabalhar para manter a fertilidde do solo. O plantio de arroz costuma ser feito no mesmo solo cada três ou quatro anos. O solo não é, então, cultivado entre os plantios e volta a ser pasto para o gado. Com o uso de herbicidas, o pasto degrada, a produtvidade primária decai, prejuízo para o fzendeiro, dono da terra. Em rotação com cultivos de inverno, será perfeitamente possível plantar arroz todos os anos no mesmo solo e manter alta a produtividade. Assim como a maioria domina bem a técnica de irrigar suas lavouras para o plantio, poderia igualmente drená-las bem no inverno e plantar feno para o gado que, em geral, carece então de alimento. Poderiam ser semeadas consorciações de azevem, aveia e leguminosas, o proveito seria múltiplo - preservação e melhora da fertilidade do solo, produção adicional de feno para animais e com o plantio todos os anos, poderia aumentar consideravelmente a produção de arroz, sem falar na vantagem ecológica. Para que isto acontecesse, seria desejável que o próprio dono da terra plantasse ou que os contratos de arrendamento dessem mais seguranças ao plantador. A economicidade e sustentabilidade do cultivo do arroz poderia ainda ganhar com o aproveitamento de algo que hoje quase sempre é tratado como lixo. Para uma política energética racional, ele seria excelente fonte de energia de biomassa, com aproveitamento inclusive da cinza que hoje é desperdiçada nos poucos casos em que a casca de arroz é usada como combustível em secadores. Falta também uma decente política de preços que permite ao lavoureiro trabalhar com tranqüilidade sem ver, como tantas vezes acontece, o preço cair no momento da colheita devido à importações especulativas. Voltar ao índice |